De todas as coisas, ela estava feliz por que o dia estava quente. Arrumou lentamente a casa, sem pressa. Era horário de verão e ela sabia que o sol tardaria a se pôr. Colocou uma música pra tocar pra impedir a multidão dos seus pensamentos. Arrumada a casa, pegou uma cadeira de praia, um cigarro e uma cerveja. Colocou a cadeira na varanda da casa, onde o sol podia pegar só nas suas pernas e não no seu rosto. Sentou-se, abriu a cerveja e acendeu o cigarro. Mal tinha dado duas tragadas quando ele apareceu. Observou-a, olhando o sol batendo em suas pernas brancas, seu rosto coberto com os grandes óculos escuros, o cigarro entre os dedos e a cerveja ao lado da cadeira.
- Desde quando você fuma? - perguntou ele, fingindo não estar impressionado.
- Desde nunca, eu não fumo - ela respondeu e deu mais uma tragada, prendendo a fumaça na boca até os olhos lacrimejarem.
- E por que tá fumando agora? - ele continuava intrigado ao vê-la fazendo algo que nunca tinha feito.
- Por que sim. Por que eu preciso. E não, não vou continuar fumando, e não vou me viciar. É que hoje me imaginei, fumando, bebendo uma cerveja e tentando esquecer o que dói.
- Queria entender por que as pessoas, após sofrer alguma coisa, passam a ter hábitos que nunca tiveram. - ele falou, olhando diretamente pro sol e ficando momentaneamente cego.
- Não é óbvio? - disse ela e sorriu, um sorriso seco, carregado de ironia - As pessoas querem esquecer o trauma. Então abandonam a rotina que tinha quando as coisas estavam bem. Esse cigarro, esse único cigarro, é o meu refúgio por hoje. Vou fumar ele até acabar, encher meu pulmão de nicotina, e quando acabar, vou estar um pouco melhor. Eu não fumava quando estava bem. Mas fumei agora pra melhorar. E vou rezar pra não ter mais motivos pra fumar de novo.
Dizendo isso, ela terminou de vez a cerveja, fumou o cigarro até acabar, e ignorando ele, entrou em casa. Seus problemas podiam não estar resolvidos, mas pelo menos ela estava aliviada.
Nenhum comentário:
Postar um comentário